mais cedo ou mais tarde, todos sentimos um desconforto. por estupidez, acomodamo-nos. só voluntariamente o podemos interromper

junho 10, 2006

[39] coisas do Da Vinci, desta vez sem códigos

Dizia o mestre uma coisa fantástica:

"A simplicidade é o mais alto grau de sofisticação."


O percurso natural que costuma acompanhar o dito crescimento - querendo desta forma designar-se o amadurecimento humano - é pretensamente ir-se ganhando qualidades, aperfeiçoando aptidões, cultivando apetências, melhorando desempenhos; enfim, progredindo.

Ora, sem querer desvalorizar a regra, pois que a natureza humana é acumulativa e depurativa - assim se consiga crer! - Há, porém, certos atributos que eu acho que acontecem inversamente a essa regra. Dentro deles retiro a inocência*, por exemplo, que aqui pretenderei defender que se ganha, também, ao invés de se perder.

Passo a explicar:

É atribuída às crianças esta qualidade que se diz ir-se perdendo ao longo do crescimento, alvo das sucessivas investidas sociais que obrigam o ser humano a defender-se, receando. Nesta linha de causalidade, o medo actua como um álibi que iliba a falta de inocência na idade adulta. Associado à inocência, podemos agrupar qualidades como a sinceridade, a frontalidade, ou a transparência. É quase inerente o perdão que é dado aos adultos por agirem dentro de um comportamento estereotipado, pois que é reconhecido por uma maioria que o utiliza e o normaliza, tornando-o natural. Mas, repare-se, é anti-natural, pois que surge como reacção a uma causa social e não a uma qualidade inerente, logo, natural.

Na minha tese da inocência, apoio-me em Da Vinci - que me perdoe a ousadia! - pois considero que quando decepamos os medos postiços que vamos ganhando como camadas de cebola ao longo dos anos, apenas a encobrimos, mas não a perdemos.

Felizes e mais aptos, são aqueles que se 'descascam' conscientemente reconhecendo que o espanto é a mola que lança para o conhecimento (de si, do mundo) e está fortemente agregado a essa qualidade dita infantil.

Como não ser-se cada vez mais inocente, se ser-se mais apto, mais consciente de si e do outro, é ser-se mais puro e querer conhecer(-se), visto não se perder a capacidade de se espantar?

Deixo a pergunta, inocentemente...

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* não confundir com ingenuidade

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